![]() |
Díario Corumbaense |
Apesar da aparente recuperação das onças-pintadas após incêndios devastadores e secas prolongadas, o Pantanal vive uma crise silenciosa. Pesquisa publicada na revista Global Change Biology, conduzida por cientistas brasileiros e norte-americanos, revelou que mesmo com a resiliência desses grandes felinos, o ecossistema está à beira do colapso se medidas urgentes não forem tomadas.
O estudo, realizado em uma área remota e protegida do Pantanal Norte, em Mato Grosso, mostrou que as onças-pintadas — mesmo com queimaduras, perda de território e colapso do habitat — conseguiram se recuperar ao longo do tempo. Registros por armadilhas fotográficas e amostras genéticas indicam aumento populacional em áreas alagadas, o que sugere que essas regiões funcionam como refúgios climáticos, essenciais para a sobrevivência da fauna.
Em 2020 e 2024, o bioma foi severamente atingido por incêndios. Em 2022, imagens chocantes mostraram onças com patas queimadas vagando em busca de abrigo e água. Ainda assim, dados recentes revelam que muitas sobreviveram e novas onças passaram a habitar a área. “A fauna se adapta, mas os sinais de colapso são claros. O Pantanal está queimando e secando cada vez mais rápido”, alerta um dos autores do estudo.
Mudança no comportamento e na alimentação
Outro achado importante do estudo é o comportamento alimentar incomum das onças da região: elas passaram a consumir mais presas aquáticas, como peixes e jacarés. Isso não só evidencia sua capacidade de adaptação, mas também altera toda a dinâmica do ecossistema.
Esse padrão reduz a predação sobre mamíferos terrestres, permitindo que espécies como capivaras e veados se regulem principalmente pela disponibilidade de água e vegetação — e não mais pelo controle natural exercido pelas onças. Essa mudança mostra o quão sensível o ecossistema está às alterações climáticas.
Além disso, os pesquisadores observaram que as onças passaram a conviver mais próximas umas das outras, um comportamento raro para um felino considerado solitário. Essa tolerância social pode estar relacionada à concentração de recursos em áreas limitadas, forçando maior proximidade.
Seca é mais destrutiva que o fogo
A pesquisa ainda aponta que, embora os incêndios tenham causado impactos imediatos e visíveis, a seca extrema é o fator mais crítico na perda de biodiversidade. A escassez de água altera o comportamento de todas as espécies, reduz habitats naturais e agrava os efeitos do fogo, criando um ciclo vicioso de destruição.
A seca prolongada modifica a composição da comunidade de mamíferos e reduz as chances de regeneração da flora, que já luta contra a desertificação acelerada.
O que está em jogo
A área estudada é uma das poucas no Pantanal que ainda permanecem relativamente intocadas por ações humanas. Porém, o crescimento populacional das onças em regiões de refúgio levanta um novo alerta: o número crescente de felinos avistados em áreas urbanas pode ser reflexo da pressão sobre seus habitats naturais no sul de Mato Grosso do Sul.
Para os especialistas, isso reforça a urgência em proteger áreas estratégicas e implementar um plano nacional de manejo do fogo, que evite tragédias como as registradas nos últimos quatro anos. O estudo também pede políticas públicas focadas na preservação de refúgios climáticos, para garantir que o Pantanal continue sendo um dos maiores santuários de biodiversidade do planeta.
Por: Victor Ocampos - Jornal A Princesinha News -